Desembargadora afasta exigência de que contribuição sindical seja cobrada por boleto e mediante autorização individual
Após a Justiça Federal do Rio de Janeiro ter anulado para dois sindicatos os efeitos da Medida Provisória 873/2019, que determina o pagamento da contribuição sindical via boleto, a Vara do Trabalho de Instância Velha, no Rio Grande do Sul, tomou decisão similar e permitiu o desconto da contribuição de uma entidade municipal de rodoviários na folha de pagamento dos empregados da categoria.
Em outro caso, envolvendo o mesmo sindicato, a desembargadora Simone Maria Nunes, do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT4), também entendeu que o presidente Jair Bolsonaro extrapolou seus poderes ao editar a medida.
“Ainda que o Executivo tenha sido eleito pela vontade popular, fruto da nossa democracia representativa, não o foi para que exacerbasse os limites que a Constituição da República lhe impõe. Promulgada a medida sem ao menos a chancela do Poder Legislativo, e tolhida do debate a população, não se constata, nesta Medida Provisória especificamente, a ‘manifestação da autêntica vontade popular’”, decidiu a desembargadora do TRT4 no mandado de segurança de número 002046448.2019.5.04.0000.
Neste caso específico, o magistrado de primeira instância, Mauricio de Moura Peçanha, juiz substituto na 3º Vara do Trabalho de São Leopoldo, havia indeferido a liminar. Para ele, parece evidente que “nesta nova sistemática jurídica, introduzida pelas recentes alterações legislativas, que não há outra forma de as entidades sindicais encontrarem suas fontes de custeio, senão a tomada de consciência de classe pelo trabalhador brasileiro”.
Mesmo que a lei não seja boa, argumenta o juiz, ela deve ser respeitada. Por isso, ele havia negado a liminar no processo de número 0020247-73.2019.5.04.0333.
Já o juiz Volnei de Oliveira Mayer, que concedeu a liminar em Instância Velha, ressaltou a “gravidade” que a medida do governo de Jair Bolsonaro irá produzir nos sindicatos e que isso requer “a adoção de medidas céleres, acautelatórias, para evitar que se termine por meios econômicos com um dos pilares do direito social ao trabalho, que é a organização sindical”. Leia a íntegra da decisão tomada no processo de número 0020406-89.2019.5.04.0341.
A proliferação contra a MP pode forçar o Supremo Tribunal Federal (STF) a acelerar a discussão sobre o tema. Já há ao menos cinco ações no STF contra a medida, incluindo uma da Ordem dos Advogados do Brasil.
No despacho, o magistrado afirma que não há “dificuldade jurídica na apreciação da demanda” e que uma rápida interpretação jurídica demonstra “facilmente, sem grande dificuldade, que não há como aplicar esta MP”.
O juiz ressalta, ainda, que a medida viola o artigo 8º da Constituição, que concede à assembleia geral das entidades o poder de fixar a contribuição, “que será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei”.
Assim, Mayer entende que a MP não poderia ter retirado das assembleias gerais dos sindicatos o poder de deliberar pela categoria, uma vez que a medida exige a autorização expressa e individual dos trabalhadores para que a cobrança ocorra.
Além disso, o juiz afirma que o custo da emissão de códigos para os pagamentos seria muito alto e inviabilizaria ainda mais a atividade sindical.
“Se questiona a necessidade de o desconto ser por boleto, gerando altos custos de remessa via postal e pagamento ao sistema financeiro de pelo menos R$ 6,00 por boleto, além de mais R$ 10,00 para eventual cancelamento. A medida provisória cria um custo que não havia”, diz.
“Dessarte, em caráter liminar, inaudita altera parte, determino que a reclamada não observe os termos da medida provisória 873/2019, realizando os descontos assistenciais previstos em normas coletivas e na forma estipulada nestes instrumentos coletivos”, conclui o magistrado.
O TRT4 também argumentou que a deliberação da assembleia da categoria que autorizou o desconto em folha da contribuição sindical ocorreu antes da edição da medida provisória.
“Cabe ao Poder Legislativo fazer as leis, e ao Poder Judiciário, mediante provocação, interpretá-las. No caso concreto, observa-se que o Poder Público está a interferir na organização sindical, alterando os meios pelos quais o sindicato recolhe as verbas que lhe garantem subsistência, inviabilizando assim a sua atividade. Não se olvide que a Constituição Federal estabelece que o sindicato defenda e represente a categoria profissional, e não somente seus associados. Também deve-se ter em vista que a Medida Provisória em comento ataca o ato jurídico perfeito e o direito adquirido do impetrante”.
Fonte: www.trt4.jus.br